segunda-feira, outubro 30, 2006

Pessoas Que Vivem Abaixo das Suas Possibilidades

E depois há aquelas pessoas que vivem abaixo das suas possibilidades, isto é: que podem comprar 3 carros distribuidos pela familia mas acabam por circular em 3 enormes rádios volantes tunados que enquanto o semáforo não abre contaminam o metal vibrante dos carros adjacentes; que podem viver numa imensa casa com espaço para arrumação mas semeam as engenhocas ultrapassadas detrás das estátuas de dálmatas sentados; que na mesma casa distribuem televisões pelas paredes orientando os sofás da sala para a parede projectada que se torna o coração da sala em detrimento da lareira; que procriam uma familia de anões de jardim polidos diáriamente e aos filhos depositam-nos na casa dos avós antes das constantes festas sociais; que em vez de educarem os mesmos filhos na perspectiva da meritocracia lhes demostram no quotidiano as vantagens do marketing pessoal acumulado ao impune nepotismo (esse nepotismo, nos seus múltiplos cambiantes subtis apesar de tudo escancarados). A parte cómica é falarem com sotaques inventados.

O Coroneu estarrecido observa sempre curioso quando tropeça num membro dessa espécime. Lembra-se de vários episódios ("você sabe quem eu sou" ao pagar na discoteca, resposta de alguém "é o que vai para último da fila") desejando quando crescer não se transformar numa dessas pessoas que vivem abaixo das suas possibilidades.

terça-feira, outubro 24, 2006

Se Pudesse Escolher Só Uma

Se há uma coisa que a parte infantil do Coroneu (isto é, 95% do Coroneu) gosta de rever nos filmes do Harry Potter é a forma visual como a magia subverte a realidade e se pudesse escolher só uma não eram as tochas que acendem sozinhas, não era o espelho da sinceridade, não era a varinha mágica, não era voar na vassoura Nimbus, não era receber correio pelo ar, nem sequer era a manta da invisibilidade. Se 95% do Coroneu pudesse escolher só uma da magias, escolhia aquela do album em que as pessoas das fotografias se mexem e riem e falam tão coloridas e reais como se ainda estivessem vivas.

(e se tivesse um album assim 95% do Coroneu - que é també 95% das pessoas? - passava pelo menos 1h por dia a conversar com as fotografias.)

sábado, outubro 21, 2006

Concertação de Conteúdos nos Grupos Sociais



Em perspectiva de um casamento, um amigo do Coroneu suspirava aliviado ao certificar-se que era o único convidado da empresa. Como este amigo do Coroneu é considerado uma pessoa genuína, o Coroneu conclui que esse alívio pode ser sinal menos positivo do contexto laboral em que ele está inserido. Parece ao Coroneu que afirmar de uma pessoa que é genuína ou autêntica, significa que em diferentes contextos sociais e profissionais essa pessoa apresenta uma postura invariável traduzida num comportamento linear, que transmite a sensação de coerência consigo própria.

Porém, motivado pelos conteúdos de linguagem própria que cada grupo social constrói - o grupo social da infância, do secundário, da universidade, dos colegas de profissão, do desporto, de ambientes transversais - o comportamento pode mitigar essa tal coerência, expondo numa mesma pessoa um individuo extrovertido num grupo, um individuo ponderado noutro grupo ou um individuo pueril noutro ainda.

(tendo a mão escorrido para um lado diferente ao pretendido quando escreveu o título deste post, o Coroneu arrisca concluir afirmando que uma empresa tem maior agrado não só quando satisfaz a carteira dos seus empregados, mas ao incentivá-los a sublimar a genuinidade, como fazem empresas jovens como a GOOGLE e a OPTIMUS, criando condições de melhoria da qualidade de vida).

quinta-feira, outubro 19, 2006

No Café Entre Um Casal

Ele: Volta e meia liga-me a perguntar se tenho o dinheiro.
Ela: Que lata a dele.
Ele: Hoje ligou-me e eu respondi-lhe é pá espera pelo fim do mês!
Ela: Mas dinheiro para te ligar ele tem, o chato.
Ele: Sempre a ligar, sempre a ligar.
Ela: Que lata. E a divida é de quê?
Ele: Isso não te interessa.

(silêncio)

Ela: É mas é bem feita para não ficares a dever dinheiro às pessoas!

quinta-feira, outubro 12, 2006

Oggi Ho Voglia Di Parlare Italiano

Quando acontece cruzar-se na rua com estrangeiros curvados para um mapa, o Coroneu fica suspenso naquela ansiedade imberbe de ser útil. Atrasa o passo inventando pretextos a si próprio, assobia para as nuvens, disfarça mirar as montras, simula mensagens ao telemóvel. Em resumo fica a rondar como um tolo disponível na esperança consciente que lhe peçam ajuda. E porquê isso, meditava o Coroneu depois de sair do restaurante. Na altura do café pós-almoço entrara no restaurante um alemão. O Coroneu observara quando ao balcão confundiram a súplica "Badezimmer" com a ementa. Ou seja, enquanto o alemão procurava uma casa de banho eram-lhe enunciados os pratos do dia (em voz alta, porque a crença mundial dita que o forasteiro entende o idioma local se berrado palavra a palavra). Como o alemão do Coroneu é nulo, não foi além de elucidar o visitante. No mesmo dia, entre bares no meio da noite, o Coroneu teve oportunidade de falar com um casal de italianos. Estavam em lua-de-mel e o Coroneu felicitou-os quando se despediram.
- Ciao, tanti auguri!, gli hai detto Coroneu prima d'andare via. Mentre tornava a casa sua pensava como se senteva felice perch'oggi aveva veramente voglia di parlare italiano.

segunda-feira, outubro 09, 2006

Uma Mulher Desmazelada Não Serve para Nada

"And I’d join the movement, If there was one I could believe in.
And you can swallow, Or you can spit, You can throw it up, Or choke on it.", Acrobat, U2

O caderno principal do semanário Sol publicado dia 30 de Setembro apresenta uma entrevista a Maria José Nogueira Pinto. No blogue da política de 54 anos lê-se que é vereadora da Câmara Municipal de Lisboa (infelizmente o blogue não informa mais sobre a vereadora do pelouro de Habitação Social da CML talvez porque o blogue, chamado "Lisboa em boas mãos", foi abandonado há um ano atrás, um mês depois de ser eleita).

O Coroneu informa que se trata da mesma vereadora que lançou recentemente em todos os orgãos de comunicação social o empreendimento do Casalinho da Ajuda - apesar da primeira pedra ter sido lançado pela anterior vereadora da Habitação Social, Helena Lopes da Costa, antes das eleições autárquicas. Quanto à entrevista, o Coroneu achou-a realmente imprevista. Diz a entrevistada que "sou uma boa meia dose". Perdão a quem simpatiza com a senhora mas pelos pitéus da entrevista, acrescenta o Coroneu, só se for meia dose de parvoíce.

- Sai meia dose de parvoíce por favor!:

"As pessoas que trabalham comigo sabem que nos momentos de grande crise, quando é preciso reflectir e tomar decisões vou para a Zara.", todo o líder político precede uma decisão de crise com a visita à loja de roupa preferida - Kennedy na crise dos misseis de Cuba, Saddam na invasão do Kuwait, D. Afonso Henriques na batalha de S.Mamede...

"As peles hoje são todas de animais criados em cativeiro, não há casacos feitos com peles de animais selvagens. Isso é uma falsa questão.", e mesmo a ser verdade toda a gente sabe que um animal de cativeiro não está confinado a um espaço reduzido, não são electrocutados, asfixiados, envenenados, gaseados ou estrangulados. Nem os criadores recorrem a estes métodos de matança para que as peles fiquem intactas. Nada disso, é uma falsa questão...

"Uma mulher desmazelada não serve para nada. (...) É uma mulher que não se pinta um bocadinho, que não tem um berloque, uma roupinha da Zara. Não as imagino a tomar conta de nada. (...) A casa deve ser um caos, não deve haver jantar.", porque o jantar deve ser feito pela mulher, porque a capacidade de trabalho mede-se pela maquilhagem - é estranho aqueles prémios Nobel que são desmazelados no vestuário - e porque, já se sabe, ir à Zara e só à Zara faz reflectir nas grandes questões do nosso tempo.

"As mulheres mais novas do PCP e do BE não são nada desmazeladas. Há 30 anos aquele discurso corresponderia a uma mulher desmazelada.", é que o discurso das mulheres espelha a sua aparência fisíca, uma das técnicas arqueológicas do futuro será ouvir discursos da personalidade para imediatamente saber como a personalidade se vestia.

"Não tenho medo que digam que ando sempre vestida da mesma forma porque as pessoas sabem que podia andar com roupa diferente. Essa é uma prerrogativa de classe da qual não me envergonho.", o importante é que as pessoas saibam que há poder de compra para andar diferente, pode-se até andar nú mas atenção - só não faz mal se as pessoas souberem que se podia andar vestido.

"Se estou no estrangeiro ponho sempre biquíni. Não há nada pior que nadar de fato-de-banho. Em Portugal uso fato-de-banho porque aqui todos me conhecem.", não faz mal fazer coisas que envergonham desde que não haja ninguém conhecido por perto, aliás, é tão óbvio que qualquer adolescente sabe disso...