terça-feira, outubro 23, 2007

Sons de Abelhas e Asas e Assim

"But then there comes that moment rare
When, for no cause that I can find,
The little voices of the air
Sound above all the sea and wind"
.............................................'Voices of the Air', Katherine Mansfield

Para além de um chefe omnipotente que descompensado pela ausência da playstation diverte-se a brincar aos gestores de topo, a vida corre bastante bem ao Coroneu que tem tanta consciência dessa raridade como dos sons especiais que se sobrepõem ao chato quotidiano. O Coroneu passa a maior parte do dia a fazer aquilo que gosta, metade da semana ao ar livre e metade do mês fora do país. E metade do tempo espantado por lhe pagarem para isso. Quanto aos amigos, o Coroneu arranja-os bons e sãos - e pela metade do preço num mercado de bairro conhecido mas que não desvendará aqui, claro, e onde nos últimos sábados de cada mês ainda há descontos de quantidade. A saúde não podia ir melhor embora algumas vozes minoritárias assobiem por ai boatos dirigidos à barriga sedentária do Coroneu, o que facilmente se resolverá na abertura da próxima temporada de body combat. Mas o que faria o Coroneu feliz, feliz, seria na abertura da temporada apanhar em frente um tal chefe e, de acordo com o treino, aplicar como quem não dá por isso, um ou dois ganchos e rotativos à moda do CTRL+LFT+GREEN da consola no Virtual Fighter que provocam no oponente rouxidão e olhos esbugalhados e vertigens de quem dá duas ou trés rotundas à volta de si próprio antes de se estatelar inerte e inofensivo contra o chão duro. Ah, como a vida é bela!...

terça-feira, outubro 09, 2007

Companhia de Atávicas Insónias Furtuitas

"Long walks at night--
that's what good for the soul:
peeking into windows
watching tired housewives
trying to fight off their beer-maddened husbands."
..........................'And The Moon And The Stars And The World', Charles Bukowski

Numa daquelas noites de insónia em que nem os livros sonolentos adormeciam o Coroneu, um silvo cruzou o muro e o telhado batendo à porta da janela entreaberta pelo calor e o Coroneu nem precisou de confirmar para saber quem chamava e desceu pelas escadas sem ligar as luzes do corredor, procurou as chaves no escuro retendo os movimentos conforme o tilintar das argolas e fechando a porta atrás de si saiu para o escuro da noite de Verão.

Os uivos cúmplices dos cães abafaram a fuga e os dois enviesaram-se nas esquinas transformadas do dia para a noite e ficaram simplesmente a dar voltas e voltas à aldeia a espreitar janelas com cortinas fantasmas ou escutar nos lados da ermida amantes escondidos nos sofás dos carros. A solidão da insónia, quando partilhada à noite, tem muito mais sabor.

Agora, numa noutra cidade e passadas tantas noites, o Coroneu pôs-se a pensar por onde andaria aquela companhia atávica de insónias furtuitas.